Você conhece algum trabalhador doméstico sem carteira assinada?
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há quase 6 milhões de trabalhadores domésticos em todo o país, sendo que em 2022, somente 1,5 milhão estavam com registro na carteira.
Infelizmente isso ainda é muito comum e pode trazer enormes prejuízos, tanto para o trabalhador quanto para o empregador.
No conteúdo de hoje, vou tratar sobre os riscos de quem atua sem carteira assinada, quais são os direitos garantidos por lei e como recorrer contra tal irregularidade.
Quem é considerado trabalhador doméstico?
De acordo com o Ministério do Trabalho e Previdência, considera-se trabalhador doméstico a pessoa maior de 18 anos que presta serviços de natureza contínua (frequente, constante) e de finalidade não-lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas.
Nesse cenário, integram a categoria os seguintes trabalhadores: cozinheiro, governanta, babá, lavadeira, faxineiro, vigia, motorista particular, jardineiro, acompanhante de idosos, entre outras.
Lembre-se que é necessário que a casa/local onde a atividade é exercida, não possua finalidade lucrativa.
O que caracteriza o trabalho sem carteira assinada?
O artigo 3º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) define que o empregado é toda pessoa física que presta serviços contínuos ao empregador por meio de um contrato de trabalho e anotação na Carteira de Trabalho (CTPS).
O trabalho sem carteira assinada ocorre justamente quando este empregador deixa de cumprir com sua obrigação e não registra a carteira do trabalho do funcionário recém-admitido no prazo de até 5 dias úteis após a contratação.
Por lei, o profissional que atua em trabalho doméstico por mais de 2 dias da semana na residência de seu empregador, deve receber um contrato de trabalho, ter a carteira assinada e inscrição no eSocial.
Já as diaristas (profissionais que trabalham até 2 dias na semana na casa do empregador) não necessitam de registro em carteira ou eSocial.
Riscos para o trabalhador doméstico sem carteira assinada
Confira a seguir as consequências de se manter em um trabalho doméstico sem carteira assinada:
Ficar sem um acerto trabalhista justo
Muitos são os casos que chegam aqui no escritório de empregados domésticos que trabalharam durante x período sem a carteira assinada, até serem dispensados.
Podemos dizer que em 95% dessas situações, o empregador acertou somente os dias trabalhados dentro do mês, quando muito.
A informalidade acaba deixando o trabalhador no risco financeiro, pois não há nada que garanta que o empregador fará o acerto trabalhista correto, com o devido pagamento de todas as verbas rescisórias previstas em lei.
Não ter direito ao seguro-desemprego
O seguro-desemprego tem o objetivo de oferecer um auxílio ao trabalhador desempregado por um período que varia de 3 a 5 meses (o que corresponde ao número de parcelas).
Um funcionário doméstico que foi dispensado sem justa causa tem o direito de solicitar o seguro-desemprego.
Requisitos
- Para 1° solicitação, é necessário ter recebido salário por pelo menos 12 meses durante os 18 meses imediatamente anteriores à data da demissão;
- Para 2° solicitação, ter recebido salário por pelo menos 9 meses durante os 12 meses imediatamente anteriores à data da demissão; e
- A partir da 3° solicitação, é necessário ter recebido salário nos 6 meses imediatamente anteriores à data da demissão.
O trabalhador sem carteira assinada não terá como comprovar que alcançou os requisitos necessários para dar entrada no seguro-desemprego.
Perda de seguridade junto ao INSS
Uma das preocupações a ser levada em conta é a manutenção da qualidade de segurado do INSS, requisito necessário para ter acesso a benefícios previdenciários e aposentadorias.
Para entender melhor o efeito disso, imagine que:
Em situações de doença ocupacional ou acidente do trabalho, o trabalhador não terá cobertura do INSS. Em casos de óbito, não haverá possibilidade de pensão por morte para seus dependentes.
Não ter experiência comprovada
O trabalho doméstico é, em grande parte, contratado mediante a comprovação de experiência na CTPS ou pelas indicações de ex-patrões.
Sendo assim, não ter a carteira assinada pode prejudicar o trabalhador doméstico futuramente, quando ele for em busca de novas oportunidades.
Riscos que o empregador assume ao deixar de assinar a carteira
Após a reforma trabalhista de 2017, o artigo 47 da CLT estabelece valores de multa a serem pagas pelo empregador que mantiver funcionário sem carteira assinada.
Os valores das multas podem variar de R$ 800,00 a R$ 3.000,00 para casos de reincidência, além de multa no eSocial, que varia de R$ 402,53 a R$ 805,06 por empregado.
Inclusive, o empregador ainda corre o risco de responder a processos trabalhistas.
10 direitos do trabalhador doméstico
Após a aprovação da Lei Complementar nº 150 de 2015, os trabalhadores domésticos passaram a ter acesso a direitos que anteriormente só diziam respeito aos demais trabalhadores.
Veja os principais:
1- Hora extra
O trabalhador doméstico pode desempenhar sua função por, no máximo, 8 horas diárias ou 44 horas semanais, sendo que, na hipótese de exercer atividades acima da jornada estipulada em lei, todas as horas excedentes deverão ser pagas como horas extras (sendo o adicional de, no mínimo, 50% a mais que o valor da hora normal).
Quem desempenha funções como cuidador de idosos ou babá, poderá adotar a jornada 12×36, em que o empregado trabalha por 12 horas seguidas e descansa por 36 horas ininterruptas.
Nestes casos, o intervalo intrajornada pode ser concedido ou indenizado. Assim, se o empregado trabalhar as 12 horas seguidas, sem intervalo, terá direito de receber o valor de 1 hora com o adicional de 50%.
2- FGTS
Até o 7° dia de cada mês, o empregador deve depositar em contas abertas na Caixa Econômica Federal, em nome do trabalhador doméstico, o valor correspondente a 8% de seu salário.
O saldo compõe o Fundo de Garantia do funcionário, que poderá sacá-lo em ocasiões específicas, como no momento da rescisão contratual.
3- INSS
O empregado de carteira assinada é um segurado obrigatório do INSS, com direito a auxílio-doença, auxílio-acidente, pensão por morte, aposentadoria, entre outros benefícios.
Caberá ao patrão recolher o valor da contribuição previdenciária, descontando o valor do salário do trabalhador.
4- Intervalo para refeição e/ou descanso
Para uma jornada de trabalho de 8 horas diárias, o intervalo para refeição ou descanso deve ser de, no mínimo 1 e, no máximo, 2 horas.
Mediante acordo escrito entre empregado e empregador, o limite mínimo de 1 hora pode ser reduzido para 30 minutos.
No caso do trabalhador doméstico que reside no local de trabalho, o período de intervalo poderá ser dividido em dois períodos, desde que cada um deles tenha, no mínimo, 1 hora, até o limite de 4 horas ao dia.
5- Repouso semanal remunerado
O RSP (repouso semanal remunerado) deve ser concedido ao empregado doméstico preferencialmente aos domingos, além de descanso remunerado em feriados.
Se houver trabalho neste dia, o descanso deve coincidir com o domingo, no máximo, a cada duas semanas.
6- Adicional noturno
O empregador deve pagar adicional noturno ao trabalhador doméstico que trabalhe no período das 22h às 5h.
O adicional deve ser o acréscimo de, no mínimo, 20% sobre o valor da hora diurna.
7- Férias
As férias correspondem ao período de descanso de 30 dias sem prejuízo na remuneração e com acréscimo de ⅓ do salário, garantido ao trabalhador doméstico que completou 1 ano de trabalho.
A Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) alterou alguns pontos referentes a esse benefício, como o seu parcelamento em até 3 períodos, sendo que 1 deles não pode ser inferior a 14 dias corridos e os demais não podem ser inferiores a 5 dias corridos.
O empregador também deve se atentar ao início das férias do funcionário, que deve ser, no mínimo, em até 2 dias que antecedem feriados ou dia de repouso semanal remunerado.
8- 13º Salário
Consiste no pagamento de um salário extra aos trabalhadores no final de cada ano.
O 13º salário poderá ser pago integralmente ou proporcionalmente, de acordo com o período trabalhado no ano.
9- Licença-maternidade
Período remunerado de 120 dias em que a empregada doméstica permanece afastada do trabalho após ganhar seu bebê, e deve ter início a partir do 28º dia antes do parto.
A trabalhadora adotante (que adotar ou obtiver guarda judicial de uma criança) também tem direito à licença-maternidade.
10- Estabilidade de gestante
O Artigo 10 da Constituição Federal proíbe a dispensa arbitrária e sem justa causa da funcionária gestante, desde quando se confirma a gravidez, até 5 meses após o parto.
Inclusive, se a gestação é descoberta durante um contrato de trabalho com prazo determinado ou aviso prévio indenizado ou trabalhado, a estabilidade provisória deverá ser respeitada.
Você é um trabalhador doméstico sem carteira assinada? Saiba o que fazer
Até aqui você pôde entender melhor sobre os riscos e prejuízos que o trabalhador doméstico está exposto ao aceitar continuar em um trabalho sem registro.
Os 10 direitos que listamos também são garantias previstas somente a quem possui carteira assinada.
Por isso, se o empregador não cumpriu com seu dever de modo espontâneo, há duas alternativas:
Converse com seu empregador e peça o registro retroativo
Inicialmente, nós recomendamos que você busque um diálogo com o seu patrão, solicitando o registro retroativo em sua CTPS, ou seja, desde a data em que foi admitido.
Isso é muito importante para o âmbito previdenciário, pois todo o período contará como tempo de contribuição ao INSS.
Se a conversa amigável não for um caminho efetivo, não resta outra alternativa a não ser judicializar a situação.
Busque a Justiça Trabalhista
Para isso, busque a ajuda especializada de um advogado especialista.
Em um processo bem encaminhado (com as devidas provas), grandes são as chances do vínculo ser reconhecido e o empregador ser condenado ao pagamento de todas as verbas.
Eu posso te ajudar! Entre em contato conosco e terei o prazer de atendê-lo(a).