Fui aposentado e agora fui dispensado: posso continuar trabalhando no Estado?
Você é servidor público celetista e foi surpreendido com um ato de desligamento após se aposentar? Está em dúvida se isso é legal? Esse artigo é para você.
A Emenda Constitucional nº 103/2019, conhecida como a Reforma da Previdência, trouxe diversas mudanças no sistema previdenciário, mas também gerou muitas dúvidas e arbitrariedades em relação ao vínculo de trabalho de empregados públicos celetistas que se aposentaram e continuaram em atividade.
Vamos explicar, com base em um caso real, quem pode ser dispensado, quem tem direito de permanecer, e quais os próximos passos para quem foi desligado de forma irregular.
📌 Aposentado pode continuar trabalhando no serviço público?
Depende. A regra geral da EC 103/2019, em seu artigo 37, §14, diz:
“É vedada a permanência do servidor público em atividade após a concessão da aposentadoria voluntária, ressalvadas as acumulações permitidas pela Constituição.”
O problema é que esse texto é genérico e tem sido aplicado de forma arbitrária a situações completamente distintas, sem considerar:
A natureza do vínculo (efetivo ou celetista);
O ingresso no serviço público antes da EC 103;
Casos de reintegração por anistia, como os servidores egressos da antiga CAIXEGO.
🤯 O que está acontecendo com os celetistas aposentados?
Em muitos estados, como Goiás, órgãos públicos passaram a notificar e desligar empregados públicos celetistas logo após identificarem a concessão de aposentadoria pelo INSS, com base direta na EC 103/2019 — sem processo administrativo, sem contraditório e sem análise do caso concreto.
É exatamente o que ocorreu com vários servidores do DETRAN/GO, anistiado da CAIXEGO, com vínculo CLT, aposentado pelo INSS em 2022 e notificado para desligamento automático em 2025.
👥 A quem se aplica a vedação da EC 103/2019?
✅ Aplica-se, com mais segurança:
A servidores públicos efetivos estatutários que se aposentaram voluntariamente.
A cargos inacumuláveis em que há regime próprio de previdência.
❌ Não se aplica automaticamente a:
Empregados públicos celetistas, inclusive aqueles em empresas públicas extintas.
Servidores anistiados, reintegrados sem concurso, com base em lei especial (Lei 8.878/94 e similares).
Casos em que não houve rompimento formal do vínculo nem previsão expressa de extinção automática no regime da entidade.
📚 O que diz a jurisprudência sobre isso?
A Súmula 361 do TST afirma que a aposentadoria espontânea não extingue automaticamente o contrato de trabalho, especialmente no regime celetista.
O STF, no Tema 606, trata da vedação ao reingresso no serviço público após aposentadoria voluntária, mas não resolveu o impasse dos celetistas anistiados ainda em atividade.
Há decisões que reconhecem o direito à permanência até o encerramento do vínculo de forma formal e legal.
🛡️ Seus direitos como servidor celetista aposentado
Se você:
Está regido pela CLT;
Foi anistiado ou reintegrado;
Não teve processo administrativo para apurar a regularidade do vínculo;
Foi dispensado apenas por ter se aposentado;
⚠️ Você pode estar sofrendo um ato arbitrário e inconstitucional.
📝 O que você deve fazer agora?
1. Reúna seus documentos:
Termo de reintegração/anistia;
Aposentadoria (NB do INSS);
Notificação de desligamento;
Contratos antigos (CAIXEGO, DETRAN);
Ficha funcional completa.
2. Procure um advogado especializado em direito administrativo e previdenciário para:
✅ Analisar a legalidade do desligamento;
✅ Verificar se há direito à continuidade no cargo;
✅ Impetrar Mandado de Segurança com pedido liminar para suspender os efeitos do desligamento.
3. Exija o contraditório
Você não pode ser desligado automaticamente. O Estado precisa respeitar o devido processo legal, o direito à defesa e à motivação do ato.
🧠 Dúvidas comuns que você pode ter — e por que elas não se sustentam
“Mas eu já estou aposentado. Não tenho mais direito de trabalhar.”
👉 Errado. A aposentadoria não rompe automaticamente o vínculo celetista, salvo se houver previsão legal ou estatutária. O seu vínculo precisa ser formalmente encerrado.
“A emenda é nova, então se aplica a todos.”
👉 Errado. O direito adquirido e a irretroatividade das normas prejudiciais continuam valendo. Seu vínculo foi formado antes da EC 103.
“O Estado sabe o que faz, não tem como recorrer.”
👉 Errado. O Estado erra, e erra muito. Muitos desligamentos estão sendo revertidos por via judicial com mandados de segurança.
🛤️ O que vem depois?
Após a concessão da liminar, o processo seguirá com:
Análise do mérito: O juiz decidirá se o desligamento foi realmente ilegal.
Possível reintegração definitiva ou manutenção do vínculo até novo ato válido.
Indenização por danos morais ou materiais, caso o ato cause prejuízos (inclusive financeiros).
📣 Conclusão
A EC 103/2019 não dá carta branca para desligar qualquer servidor aposentado. Cada caso deve ser analisado conforme o vínculo, a origem da relação, o regime jurídico e o respeito ao contraditório.
Se você ou alguém que conhece está passando por isso, não aceite a dispensa de forma passiva. Procure apoio jurídico especializado e faça valer seus direitos.